OE/2017: o orçamento (possível) socialista.


A entrega dos Orçamentos neste país é sempre envolta num circo mediático tremendo. O documento, que rege as principais linhas orientadoras da gestão do próximo ano, é importante e deve ser visto como tal, mas em serenidade e não à velocidade do frenesim que a imprensa lhe confere. Mas vamos a factos. Este é realmente o primeiro Orçamento do Estado do Governo PS, liderado por António Costa. É aquele em que podemos analisar as linhas ideológicas, estratégicas e políticas escolhidas. Sabíamos que temos Bruxelas à perna com o défice. Sabíamos que não podemos abrir os cordões do lado da despesa porque a receita irá tremer. E sabíamos também que temos um crescimento interno anémico que impera impulsionar. Sabemos nós e melhor que nós sabe o ministro das Finanças, Mário Centeno, que apesar disso, lembrou que em 2017 é preciso dar mais ênfase às exportações e ao investimento. Na verdade, numa coisa a direita tem razão, este Orçamento assenta numa lógica de aumento de impostos. Mas assenta este e todos os anteriores, independentemente dos partidos que estão no poder. É uma espécie de retórica giratória, que assola PS e PSD na lógica dos argumentos, dependendo da posição em que cada um deles se encontra. Porém, este aumento de impostos revela a genuína marca da esquerda, e das esquerdas. Porque eles situam-se ao nível do consumo e do património. São impostos que dizem ao país uma coisa muito simples: quem tem mais, paga mais. Se juntarmos a isso o tímido aumento nas pensões e a eliminação progressiva da sobretaxa no próximo ano, na verdade este é o orçamento mais social desde que a Troika por cá chegou em 2011. É pouco? É. Mas alivia, em muito, o peso dos impostos do trabalho sobre os contribuintes.
Se vai ser suficiente? Não sabemos. Mas um país tão sacrificado como o nosso nos últimos anos precisa respirar. Resta saber se finalmente o arco do poder em Portugal conseguirá gerir sustentavelmente o barco, sendo que serão necessários ainda mais cortes, e manter, ao mesmo tempo, a coesão social sem mais mazelas de maior. Colocar Portugal na rota do crescimento económico e preservar a proteção social é o grande desafio para 2017 e anos seguintes. Para este ou qualquer Governo que tenhamos. Uma nota final e negativa para a ausência de medidas mais agressivas no que ao desemprego diz respeito. Veremos se o maior flagelo que ainda nos atinge terá relevância para António Costa e para as esquerdas que lhe estão a dar a mão.

Crónica de 17 de outubro, na Antena Livre, 89.7, Antena Livre. OUVIR.

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