A carta de Sócrates.
A carta de José Sócrates enviada ao Público, na íntegra, seis dias depois de ter sido detido no aeroporto para interrogatório no âmbito do processo Marquês. Na Justiça, como em tudo na vida, há sempre dois lados da mesma moeda.
«Há cinco dias “fora do mundo”, tomo agora consciência de que, como é
habitual, as imputações e as “circunstâncias” devidamente seleccionadas contra
mim pela acusação ocupam os jornais e as televisões. Essas “fugas” de
informação são crime. Contra a Justiça, é certo; mas também contra mim.
Não espero que os jornais, a quem elas aproveitam e ocupam, denunciem o
crime e o quanto ele põe em causa os ditames da lealdade processual e os
princípios do processo justo.
Por isso, será em legítima defesa que irei, conforme for entendendo,
desmentir as falsidades lançadas sobre mim e responsabilizar os que as
engendraram.
A minha detenção para interrogatório foi um abuso e o espectáculo
montado em torno dela uma infâmia; as imputações que me são dirigidas são
absurdas, injustas e infundamentadas; a decisão de me colocar em prisão
preventiva é injustificada e constitui uma humilhação gratuita.
Aqui está toda uma lição de vida: aqui está o verdadeiro poder – de
prender e de libertar. Mas em contrapartida, não raro a prepotência atraiçoa o
prepotente.
Defender-me-ei com as armas do estado de Direito – são as únicas em que
acredito. Este é um caso da Justiça e é com a Justiça Democrática que será
resolvido.
Não tenho dúvidas que este caso tem também contornos políticos e
sensibilizam-me as manifestações de solidariedade de tantos camaradas e amigos.
Mas quero o que for político à margem deste debate. Este processo é comigo e só
comigo. Qualquer envolvimento do Partido Socialista só me prejudicaria,
prejudicaria o Partido e prejudicaria a Democracia.
Este processo só agora começou».
Évora, 26 de Novembro de 2014
José Sócrates
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